Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de
recursos ordinários, interpostos contra sentença proferida pelo Juízo da
5ª Vara do Trabalho de Uberlândia, em que figuram: como recorrentes, F.
M. C. B. S. C. Ltda. e B. B. S.A. e B. B. C. S.A. e, como recorridos,
os mesmos e R. P. O. dos A.
Relatório
O d. Juízo da 5ª Vara do Trabalho de Uberlândia, pela r.
sentença de fls. 355-357, cujo relatório adoto e a este incorporo,
julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, condenando os
reclamados, B. B. S.A. e B. B. C. S.A. e F. M. C. B. S. C. Ltda.,
solidariamente, a pagarem ao reclamante, R. P. O. dos A., no prazo de
oito dias, as seguintes parcelas: a) diferenças salariais, mês a mês,
considerando o piso salarial do pessoal de escritório, com reflexos em
aviso-prévio, férias mais um terço, décimo terceiro salário, feriados,
horas extras e FGTS mais 40%; b) indenizações substitutivas ao
auxílio-refeição, auxílio cesta-alimentação e décima terceira cesta
alimentação; c) PLR, inclusive proporcional; d) horas extras excedentes
da 30ª semanal, a se apurarem com base nos cartões de ponto, com
reflexos, pela habitualidade, em RSR, aviso-prévio, décimo terceiro
salário, férias mais um terço, e FGTS mais 40%, compensadas as horas
extras já quitadas; e e) sábados, domingos e feriados trabalhados com
adicional de 100%.
Inconformada, a terceira reclamada, F. M. C. B. S. C.
Ltda., interpõe recurso ordinário a fls. 358-368, insurgindo-se contra o
reconhecimento do vínculo de emprego com o B. B. S.A. e,
consequentemente, contra o deferimento das verbas daí decorrentes.
Alega, ainda, que são indevidas as horas extras, bem como os reflexos
decorrentes da majoração do repouso semanal remunerado pela integração
das horas extras.
O primeiro e segundo reclamados, B. B. S.A. e B. B. C.
S.A., respectivamente, interpõem recurso ordinário, a fls. 370-382,
pretendendo, preliminarmente, o sobrestamento do feito e alegando a
impossibilidade jurídica do pedido e a ilegitimidade passiva ad causam.
No mérito, o apelo versa sobre os seguintes temas: licitude da
terceirização e vínculo de emprego; enquadramento sindical; benefícios
dos bancários; anotação da CTPS; horas extras e reflexos; horas extras
laboradas aos sábados com adicional de 100%; benefício da justiça
gratuita; fato gerador das contribuições previdenciárias; e correção
monetária.
Comprovantes de efetivação do depósito recursal e de recolhimento das custas processuais a fl. 383.
O reclamante, apesar de regularmente intimado (certidão de fl. 386), não apresentou contrarrazões.
Tudo visto e examinado.
Este é o relatório da exma. juíza relatora.
Voto
Admissibilidade
Deserção do recurso ordinário interposto pela terceira reclamada, F. M. C. B. S. C. Ltda.
Conforme exposto pela exma. relatora em seu voto:
“Compulsando os autos, verifica-se que a terceira
reclamada, F. M. C. B. S. C. Ltda., interpôs o recurso ordinário de fls.
358-368, desacompanhado dos comprovantes de realização do depósito
recursal e de recolhimento das custas processuais.
Esclareça-se que, in casu, não há como o preparo
efetuado pelo primeiro e segundo reclamados aproveitar o recurso da
terceira reclamada, nos termos do disposto na Súmula nº 128 do TST, um
vez que os reclamados, B. B. S.A. e B. B. C. S.A., em recurso interposto
de forma conjunta, requerem expressamente a exclusão da lide, visto que
sustentam a licitude da terceirização e a inexistência de vínculo
empregatício, além da inexistência de qualquer responsabilidade pelos
créditos da reclamante, verbis:
‘[...] Ante a inexistência de qualquer ilicitude na
terceirização e a impossibilidade de enquadramento do recorrido nas CCTs
indicadas, constata-se que merece reforma urgente a r. sentença neste
aspecto a fim de excluir da condenação as recorrentes, impossibilitando,
assim, qualquer determinação no sentido de responsabilizá-la solidária
ou subsidiariamente 9f. 375v)’.
De acordo com o item III da Súmula nº 128 do TST,
‘havendo condenação solidária de duas ou mais empresas, o depósito
recursal efetuado por uma delas aproveita as demais, quando a empresa
que efetuou o depósito não pleiteia sua exclusão da lide’.
Logo, aqui se aplica a parte final do referido verbete
sumular, uma vez que os outros reclamados pleitearam expressamente a sua
exclusão da lide, não havendo falar, portanto, em aproveitamento do
depósito recursal por eles efetuado.
Assim, ante a não realização do preparo de forma
regular, não conheço do recurso da terceira ré, F. M. C. B. S. C. Ltda.,
por deserto.
Por outro lado, conheço do recurso interposto pelo
primeiro e segundo reclamados, à exceção do pedido relativo à anotação
da CTPS, por inexistente condenação neste sentido, estando ausente o
interesse recursal.
Sobrestamento do feito
Os primeiro e segundo reclamados, B. B. S.A. e B. B. C.
S.A., respectivamente, pleiteiam o imediato sobrestamento do feito com
fundamento na decisão proferida no ARE nº 791.932 RG-DF.
Sem razão.
É que a decisão liminarmente proferida pelo ministro
Teori Zavascki, nos autos do ARE nº 791.932-DF, está adstrita aos feitos
em que se discute a existência de vínculo empregatício entre
trabalhador terceirizado e empresa concessionária de serviços de
telecomunicações, o que não é o caso de nenhuma das empresas envolvidas
no litígio instaurado nesta ação.
Dessa forma, indefiro o requerimento de sobrestamento ou suspensão do feito.
Preliminar de impossibilidade jurídica do pedido e de ilegitimidade passiva dos reclamados.
Os dois primeiros reclamados, ora recorrentes,
argumentam que jamais foram empregadores do autor, razão pela qual pedem
seja decretada ‘a inépcia da inicial, por impossibilidade jurídica do
pedido’. Afirmam que o contrato de trabalho foi firmado entre o
reclamante e a terceira reclamada, sendo, portanto, partes ilegítimas
para figurar no polo passivo da ação, já que eventuais direitos
trabalhistas devem ser discutidos exclusivamente com a terceira
reclamada, F. M. C. B. S. C. Ltda.
Todavia, segundo a teoria da asserção, as condições da
ação devem ser analisadas em abstrato, independentemente da existência
ou não do direito material cujo reconhecimento se pretende.
Por isso, a mera indicação do primeiro e segundo
reclamados como beneficiários dos serviços prestados pelo autor é
suficiente para autorizar sua inclusão no polo passivo da demanda, como
titulares do direito oponível à pretensão deduzida em juízo.
A imposição de responsabilidade solidária ou subsidiária
aos recorrentes é matéria afeta ao mérito e com ele será devidamente
analisada.
Rejeito”.
Mérito
1. Terceirização. Correspondente bancário. Atividade de
cobrança. Inexistência de vínculo empregatício com o tomador de
serviços.
A questão foi assim introduzida pela exma. juíza relatora em seu voto:
“Os reclamados não se conformam com o reconhecimento do
vínculo de emprego diretamente com o primeiro reclamado (B. B. S.A.).
Negam a presença dos requisitos fático-jurídicos da relação de emprego,
asseverando que as funções desenvolvidas pelo autor, de call center, não
fazem parte da rotina interna de um banco, não integrando sua
atividade-fim. Sustentam que todos os requisitos previstos nos arts. 2º e
3º da CLT foram observados apenas em relação à terceira reclamada, F.
M. C. B. S. C. Ltda., única empregadora.
Acrescentam que a terceirização de atividade-meio das
instituições financeiras é lícita, uma vez que cada uma das empresas
possui atividade principal e individual. Pugnam pela reforma da sentença
e exclusão de todas as verbas decorrentes do enquadramento do autor
como bancário.
Ao exame.
A hipótese vertente enseja a análise da licitude da
terceirização havida. Deve--se averiguar se as funções efetivamente
exercidas pelo reclamante se inserem nas atividades-meio ou nas
atividades-fim do primeiro reclamado, tomador dos serviços”.
Divirjo, data venia, do entendimento adotado pela juíza relatora, que reconheceu a ilicitude da terceirização.
A terceirização é admitida no Direito do Trabalho quando
lícita, e está prevista nas hipóteses elencadas nos itens I e III da
Súmula nº 331 do TST, ou seja: trabalho temporário, atividades de
vigilância, atividades de conservação e limpeza, e, por fim, serviços
especializados ligados à atividade-meio do tomador de serviços.
Tendo em vista que a terceirização de serviços não vem
contemplada na estrutura teórica e normativa tradicional do Direito do
Trabalho, esse novo modelo estaria a sofrer restrições da doutrina e da
jurisprudência.
Nesse prisma, o raciocínio a que se chega é que os
serviços especializados ligados à atividade-fim do tomador de serviços
seriam insuscetíveis de terceirização lícita.
Mas volvendo-se ao caso dos autos, certo é que os
elementos constantes nos autos não corroboram a pretensão autoral.
De acordo com a cópia da CTPS de fl. 17, o reclamante
foi admitido em 26/12/2012, pela reclamada F. M. C. B. S. C. Ltda., no
cargo de auxiliar de cobrança.
O contrato de fls. 216-251 revela que as reclamadas
firmaram contrato de prestação de serviços de cobrança extrajudicial de
valores representativos de créditos pertencentes à contratante, podendo a
contratada utilizar-se de todos os meios e recursos atinentes à
execução da obrigação ora contratada, observadas as normas e disposições
legais em vigência.
No caso dos autos tem-se que o reclamante não exercia
atividades tipicamente financiárias, muito menos bancárias. Tal
realidade sobressai inclusive das declarações do próprio recorrido, em
depoimento pessoal, que assim asseverou: “que fazia cobrança de cartão
Amex, atualização de cadastro dos clientes, fazia acordos, mandava para o
Serasa para fazer negativação, acesso a faturas para informar os gastos
aos clientes [...]” (reclamante, fl. 339).
Está patente que o autor não exercia atividades tipicamente financiárias ou bancárias, como alegou.
Na verdade as atividades por ele exercidas são aquelas
relativas à de cobrador ou no máximo de correspondente bancário,
realidade que sobressaiu do seu depoimento pessoal.
A Resolução nº 3.954/2011, do Banco Central, que revogou
expressamente a de nº 3.110/2003, em seu art. 8º, facultou às
instituições financeiras contratar empresas (correspondentes bancários)
para a realização de diversas atividades não bancárias, a saber:
“I - recepção e encaminhamento de propostas de abertura
de contas de depósitos à vista, a prazo e de poupança mantidas pela
instituição contratante;
II - realização de recebimentos, pagamentos e
transferências eletrônicas visando à movimentação de contas de depósitos
de titularidade de clientes mantidas pela instituição contratante;
III - recebimentos e pagamentos de qualquer natureza, e
outras atividades decorrentes da execução de contratos e convênios de
prestação de serviços mantidos pela instituição contratante com
terceiros;
IV - execução ativa e passiva de ordens de pagamento
cursadas por intermédio da instituição contratante por solicitação de
clientes e usuários;
V - recepção e encaminhamento de propostas de operações
de crédito e de arrendamento mercantil concedidas pela instituição
contratante, bem como outros serviços prestados para o acompanhamento da
operação;
VI - recebimentos e pagamentos relacionados a letras de câmbio de aceite da instituição contratante;
VII - (Revogado pela Resolução nº 3.959, de 31/3/2011.)
VIII - recepção e encaminhamento de propostas de
fornecimento de cartões de crédito de responsabilidade da instituição
contratante; e
IX - realização de operações de câmbio de
responsabilidade da instituição contratante, observado o disposto no
art. 9º.
Parágrafo único - Pode ser incluída no contrato a
prestação de serviços complementares de coleta de informações cadastrais
e de documentação, bem como controle e processamento de dados”.
Logo, denota-se que as atividades do autor se enquadram
no referido permissivo legal, pois eram serviços especializados de
cobrança.
Não vislumbro a ocorrência de fraude na contratação,
tampouco prova de subordinação jurídica direta com as reclamadas, motivo
pelo qual têm razão as reclamadas quanto à licitude da terceirização e à
improcedência do pedido de reconhecimento do vínculo de emprego.
Denota-se que, além de a atividade do autor enquadrar-se
no referido permissivo legal, não há que se cogitar, in casu, da
presença dos pressupostos necessários à configuração da relação de
emprego, conforme previsto no art. 3º da CLT.
Também não é possível a equiparação do reclamante com os
bancários ou financiários em razão do princípio da isonomia salarial,
eis que o enquadramento nessa categoria pressupõe o vínculo direto com
banco ou entidade financeira a ele equiparada, o que não é o caso dos
autos.
O pedido inicial relacionado à concessão de benefícios
previstos nos instrumentos coletivos dos financiários – diferença
salarial pela aplicação do piso da categoria, auxílio-refeição,
auxílio-cesta alimentação e décima terceira cesta alimentação e PLR –
são improcedentes, haja vista depender do reconhecimento da nulidade da
terceirização e da isonomia salarial com aquela categoria profissional.
Ressalte-se que os reclamados devem responder apenas
subsidiariamente pelos créditos trabalhistas porventura devidos ao
reclamante, nos termos da Súmula nº 331, inciso IV, do c. TST.
Provejo os recursos para reconhecer a licitude da
terceirização e afastar a declaração incidental do vínculo de emprego
reconhecido em face do primeiro e segundo réus, bem como para excluir da
condenação o pagamento das parcelas previstas nas normas coletivas
aplicáveis à categoria dos bancários, quais sejam diferenças salariais,
auxílio-refeição, auxílio-cesta alimentação, cesta alimentação
adicional, participação nos lucros ou resultados (PLR), parcela
adicional de PLR e horas extras, consideradas como tais as horas
laboradas excedentes da 6ª hora/diária e 30ª hora/semanal.
Conclusão
Ante o exposto, não conheço do recurso ordinário da
terceira reclamada, por deserto; conheço do recurso ordinário dos demais
reclamados; rejeito as preliminares arguidas; no mérito, dou provimento
para absolver as reclamadas de toda a condenação, julgando
improcedentes os pedidos iniciais. Ficam invertidos os ônus da
sucumbência, custas pelo reclamante, isento.
Motivos pelos quais o Tribunal Regional do Trabalho da
3ª Região, em sessão da sua 9ª Turma, hoje realizada, analisou o
presente processo e, à unanimidade, não conheceu do recurso ordinário da
terceira reclamada, por deserto; conheceu do recurso ordinário dos
demais reclamados; rejeitou as preliminares arguidas; no mérito, por
maioria de votos, deu-lhe provimento para, absolvendo as reclamadas de
toda a condenação, julgar improcedentes os pedidos iniciais, vencida a
exma. juíza convocada relatora que negava provimento ao apelo; fica
invertido o ônus de sucumbência; custas pelo reclamante, isento.
Belo Horizonte, 24 de maio de 2016
João Bosco Pinto Lara
Relator.
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